- Minha nossa! isso não é uma criança, é um demônio. você amaldiçoou a minha filha, você é um espirito maligno?! Livre-se desse monstro. Ela não merece ser da nossa família!!!
Ofendidos com as acusações do avô, os pais expulsaram-no da casa. Deram à garota o nome de Linghún, que em chinês significa Alma.
Com o passar dos anos, a jovem peculiar se acostumou em ser chamada de "estranha" por todos que a viam. Linghún nunca teve amigos. Pelo menos não amigos vivos. Com sua habilidade especial de ver os espíritos, era com eles que ela gostava de conversar. Por causa disso, ela ficava sabendo de tudo o que acontecia, já que seus amigos podiam estar em qualquer lugar e, qualquer momento sem ninguém perceber, e levavam a ela muitas informações valiosas.
Uma das poucas pessoas que a tratavam bem era o peixeiro da vila – um senhor de cerca de 50 anos, que aparentava ser mais velho, por conta de suas rugas profundas. Ele sempre a cumprimentava, simpático, e perguntava de seus pais. Até que um dia, quando passou em frente à peixaria, Linghún ouviu algo que não esperava:
– O que está fazendo aqui, sua pequena demônia? Volte pro inferno.
Linghún ficou chocada e seus olhos se encheram de lágrimas. O que poder ter feito ele a tratar dessa maneira? Será que antes ele estava sendo falso? Suas palavras pareciam tão sinceras... A menina não foi a única que estranhou a reação. A mulher do peixeiro, assustada, olhou para Linghún com olhar de piedade e susto e perguntou a o marido o que havia de errado com ele.
Alguns dias se passaram e outra cena chamou a atenção da garota. Um homem que vendia verduras e era bastante querido pela comunidade gritava com sua mulher no meio da rua. Parecia que estava tomado por alguma força malígna. Sua voz grossa e alta, seu olhar enraivecido, suas palavras de ódio... Algo havia acontecido com aquele homem.
Assustada, Linghún saiu correndo em direção à sua casa. No meio do caminho havia uma floricultura que sempre chamava sua atenção. Ela gostava muito de ver e cheirar as diferentes espécies que coloriam a rua. A menina também gostava de conversar com a florista – uma senhora muito gentil, que sempre mostrava as novidades à Linghún. Mas naquele dia, quando passou por ali, a garota ouviu a voz da senhora gritando com sua filha. Não era uma simples bronca de mãe: ela estava demitindo sua própria filha, com xingamentos.
Linghun ficou perplexa com a mudança de comportamento das pessoas ao seu redor, alguma coisa devia estar errada. Então ela lembrou que, como tinha poderes de conversar com espíritos, ninguém melhor que eles para contar a ela o que estava acontecendo. Afinal eles poderiam estar em vários lugares sem serem percebidos.
– Há pouco tempo chegou na cidade um homem que anda por aí com capuz preto. Quase ninguém o vê porque ele tem habilidades, assim como você, uma peculiaridade: pode aparecer e desaparecer quando quiser. Acreditamos que ele pode ter relação com essas mudanças nas pessoas.
- Mas como esse homem poderia fazer as pessoas ficarem tão malvadas? E por que ele faria isso?
- Ele ta fazendo isso, para viver por mais tempo, a alma dele é alimentada pela gentileza das pessoas. Assim quando ele rouba a gentileza de alguém essa pessoa fica egotista, grosseira e rude
-E agora, como podemos derrota-lo?!
-Nenhum mortal jamais teve coragem de derrotar esse monstro, mas você pode derrota-lo com seus poderes, afinal, é a única que pode vê-lo quando ele está agindo oculto.
Então ela se transformou em um fantasma e saiu à procura daquele perigoso sujeito. Estava passando pela praça da cidade. Num final de tarde, quando viu o encapuzado colado em um senhor que comia arroz com palitinhos no banco. O idoso, é claro, não percebia que estava prestes a ser possuído por um espirito que iria roubar-lhe toda a gentileza. Nessa, Linghun arrancou uma goiaba da árvore em que se encontrava e atirou a fruta no encapuzado.
Ele, furioso, saiu correndo em direção à menina fantasma – pois ele conseguia enxerga-la. Foi então que Linghun atirou-se contra o homem e, para a sua surpresa, seus corpos não se colidiram. Eles se tornaram um só. Assim a garota percebeu que tinha o poder de assumir outros corpos e até outros espíritos. E nessa condição ela podia de controlá-los. Foi assim que Linghun conseguiu expulsar todas as almas boas que ele havia roubado. E cada alma que deixava o corpo, fazia-o ficar mais velho. Até que a última alma – a de Linghun – se libertou daquele homem fantasma, que despencou no chão e ao atingir o solo, virou pó.
Aliviada, a menina voltou para casa e, no caminho, cumprimentou a florista, o peixeiro, o verdureiro, o senhor da praça e muitos outros que passaram por ela. A vida havia voltado ao normal e Linghun, muito orgulhosa de sua própria peculiaridade, tornou-se mais autoconfiante e todos passaram a respeita-la e até se acostumaram com se jeito um pouco estranho de ser.